O BNDES anunciou no domingo um pacote de medidas emergenciais no valor de R$ 55 bilhões com o objetivo de mitigar os efeitos da pandemia de Covid-19 no Brasil. Segundo a diretoria do banco, essas medidas são direcionadas para reforçar o caixa das empresas e tentar manter mais de 2 milhões de empregos. 

Para o nosso time de Macroeconomia, embora sejam medidas na direção correta para combater os efeitos do coronavírus na economia, elas colocam a projeção para o resultado primário do país, que estava em um déficit de R$ 200 bilhões, sob revisão, com viés de piora. 

O resultado primário mede a diferença entre as receitas e as despesas do governo, sendo uma importante medida sobre a saúde fiscal do país. Não entram nessa conta os pagamentos de juros. 

As medidas anunciadas pelo BNDES consistem em:

  • transferir R$ 20 bilhões do Fundo PIS-Pasep para o FGTS;
  • suspender o pagamento de juros e principal de parcela relevante da carteira de crédito, em financiamentos diretos e indiretos;
  • suspender amortizações para operações diretas (R$ 19 bilhões) e indiretas (R$ 11 bilhões);
  • ampliar o crédito para micro, pequenas e médias empresas, por meio dos bancos parceiros, no valor de R$ 5 bilhões. 

Nossa equipe de Macroeconomia lembra que, ao transferir R$ 20 bilhões do PIS-Pasep para o FGTS, essa movimentação é registrada como despesa primária. Embora essa operação afete negativamente o resultado primário, o resultado sobre a dívida é neutralizado pois, ao mesmo tempo, o BNDES repassa esse mesmo valor para o FAT, sendo computado como receita financeira.

Déficit projetado em R$ 200 bilhões
Na última semana,  o governo declarou Estado de Calamidade Pública devido ao avanço da epidemia de coronavírus. Na prática, o decreto desobriga o governo de cumprir a meta de resultado primário no ano, estipulada em um déficit de  R$ 124 bilhões.

A  medida  permitirá  que  o  governo  aumente  os  gastos  por  meio  de  créditos extraordinários  sem  descumprir  o  teto  constitucional  de  gastos  e  a  Lei  de  Responsabilidade  Fiscal.  A  decisão  é fundamental ao dar  instrumentos  ao  governo  para  adotar  medidas  para  combater  os  efeitos econômicos  da pandemia, auxiliar a população mais vulnerável e reforçar o sistema de saúde, destaca nossa equipe de Macroeconomia.

Entretanto,  vale  observar  que  as  medidas,  embora  signifiquem  uma  forte  deterioração  nas  contas  públicas em 2020, não devem representar uma mudança estrutural permanente. A equipe econômica tem se preocupado em manter  o  impacto  das  medidas  anunciadas  restrito a este ano.

Além disso,  o  Estado  de  Calamidade  não  exime  o governo de outras metas fiscais, como o cumprimento do teto de gastos e a regra de ouro.  Até o momento, as medidas emergenciais anunciadas devem injetar R$ 179,6 bilhões na economia. São R$ 98,4 bilhões  destinados  para  a  população  mais  vulnerável,  R$  69,4  bilhões  para  manutenção  de  emprego  e  R$  11,8 bilhões para o combate à pandemia.

Além dessas medidas, o Conselho Monetário Nacional (CMN)  anunciou medidas para facilitar a renegociação de dívidas, para dar alívio às famílias e empresas. Para  o  setor  de  saúde,  o  governo  também  anunciou  que  seria  zerado  o  IPI  dos  produtos  importados  para combater os efeitos da doença e o Imposto de Importação de 67 produtos de uso médico hospitalar.

Como resultado, nosso time de Macroeconomia revisou a projeção de resultado primário do Governo Central em 2020, de um déficit de R$  87,3  bilhões  para  R$  199,8  bilhões. Essa  revisão  foi  motivada  por  duas  frentes.    Do  lado  das  receitas,  menor projeção  de arrecadação  devido  à  revisão  do  PIB  e queda  na  expectativa de preço  médio  do  barril  de  petróleo, que diminui  receitas  de royalties.  Do  lado  das  despesas,  aumento  de  gastos  extraordinários  para  atenuar impactos da pandemia.

Ademais, a dívida bruta deverá voltar a se elevar, de 75,8% ao final de 2019 para 77,6% em 2020 (ante projeção de queda para 75% do PIB). Além da revisão do resultado primário, impactou para essa elevação a diminuição do valor esperado de repagamento do BNDES ao Tesouro esse ano, de R$ 85 bilhões para R$ 17 bilhões.

Reformas
Vale ainda mencionar que  consideramos a venda de  reservas de  dólares no montante  de US$ 40 bilhões, o que  representa alívio de, aproximadamente, 2,6% do PIB. Por fim, embora o Congresso vá se concentrar na discussão dos projetos destinados a combater os efeitos da crise nos  próximos  meses,  ainda  existe  entre  os  líderes  partidários  e  presidentes das  duas  casas  o  senso  de  urgência que  levará  a  retomada  das  discussões  em  torno  de  reformas  estruturais  relevantes.

Assim,  nosso time de Macroeconomia acredita  que  o Congresso dará respostas para essa crise aprovando os projetos do Executivo e que, passada essa fase, deverá se voltar para as matérias de ajuste estrutural para tentar estimular o processo de recuperação da economia.Nesse  sentido,  notícias  sobre  a  possibilidade  de  adiamento  das  eleições  municipais  para  2022,  se  confirmadas, poderiam  liberar  o  Congresso  para  atuar no  segundo  semestre  na  continuidade  do  processo  de  aprovação  de reformas.